quinta-feira, 20 de novembro de 2008

A Evolução Tecnológica do Vidro e as suas Consequências Sociais

Durante séculos a produção de peças de vidro foi exclusivamente manual, embora no século I A.C., com a descoberta da “cana de sopro” e com a introdução de moldes, tivesse havido uma grande revolução na fabricação do vidro.
No século XVIII, com o início da Revolução Industrial, o trabalho na indústria vidreira sofreu uma grande evolução, podendo dizer-se, um pouco por todo o mundo.
A partir dos meados do século XVIII, a introdução de moldes de aço, quer para produzir peças prensadas, quer no fabrico de embalagens por acção do sopro, trouxe algumas consequências negativas aos artesãos vidreiros da altura.
Com estes moldes houve um grande aumento da produção em série, o que levou, para além do trabalho rotineiro, ao intensificar do ritmo de trabalho.
Começou também a surgir na indústria vidreira um novo grupo de operários, que se especializaram no trabalho com máquinas.
Durante o século XIX, começou a haver, um pouco por todo o mundo, a transformação da produção vidreira. Uma indústria mais moderna, mecanizada, e automatizada, começou a surgir.
A evolução tecnológica levou também à construção de fornos de maiores dimensões, em consequência do aumento da produção de peças de vidro.
O vidro trouxe também ao mundo uma grande evolução e desenvolvimento nas áreas das ciências, biologia e no estudo do cosmos. O que seria destas ciências sem os microscópios, telescópios, termómetros, tubos de ensaio e lâmpadas, só para citar alguns exemplos.Todos eles têm como base a utilização do vidro, sob as mais diversas formas.
Dois mil anos foi o tempo que separou a descoberta da cana de sopro daquela que seria a descoberta mais revolucionária na produção do vidro plano: o sistema Float.
Será exagero fazer esta afirmação. No entanto é inegável que a partir desta descoberta, em 1959, altura em que a empresa Inglesa Pilkington, introduziu o processo Float, a fabricação do vidro plano nunca mais seria a mesma.
As empresas que produziam vidros planos, à escala mundial, seguiram este processo, ganharam em qualidade e preço, aniquilando por completo o fabrico manual nesta área do vidro.
Este processo acabado de descobrir, foi de fácil utilização e adaptação a todas as empresas, tendo-se tornado dominante em todo o mundo, em menos de duas décadas.
O sistema consiste em verter o vidro, em estado líquido, num tanque com estanho aquecido, onde ele flutua. Consegue-se, com este processo, fazer chapas de vidro plano de enormes dimensões, espessuras, cores e de qualidade superior.
Para trás ficou o sistema de rolos e a manga de vidro aberta, sistemas até aí utilizados.
Em Portugal, a Covina, empresa pertencente ao grupo Saint-Gobain, nasceu com a fusão das várias empresas que se dedicavam ao fabrico de vidro plano pelo processo manual do cilindro soprado, (manga de vidro).
Nas antigas instalações da Covina na Marinha Grande, funciona actualmente a sede social do Sport Operário Marinhense.
Outra das grandes áreas do desenvolvimento tecnológico do vidro deu-se no sector da cristalaria, no vidro utilitário.
Na minha história como vidreiro, assisti a este desenvolvimento em Portugal. Durante o ano de 1974, quando ainda trabalhava na Crisal, (antiga fábrica do Marquês), num dos dois fornos a tanque que a empresa tinha na altura, foi instalado um processo automatizado de produção de vidro utilitário, (copos, canecas, cálices, pratos, etc.).
Até essa altura, na Marinha Grande, todo este vidro utilitário, era produzido manualmente. Hoje em dia apenas são produzidos os serviços em cristal ou pequeníssimas séries, todo o resto é produzido automaticamente.
Actualmente a empresa Crisal pertence ao grupo Libbey. Nesta unidade industrial, com dois fornos a tanque instalados, com capacidade para 120 toneladas diárias, são produzidas cerca de 100 milhões de peças utilitárias ano.
Outro dos sectores em que a evolução mais se fez sentir, foi no da embalagem de vidro. Neste sector Portugal têm várias empresas das mais modernas da Europa. Três estão instaladas na Marinha Grande: Gallo Vidro, Santos Barosa e Barbosa e Almeida.
A Barbosa e Almeida tem quatro empresas na Península Ibérica, produz anualmente 2,5 Biliões de embalagens em vidro, em oito cores diferentes.
A Santos Barosa é actualmente a empresa que produz vidro, mais antiga da Marinha Grande.
Fundada em 12 de Novembro de 1889, no seu início só produzia vidro plano. Em 1894 dedicou-se também à “garrafaria” e à “cristalaria”, actualmente produz vidro de embalagem.
Até ao século XX, todo o vidro era produzido manualmente, embora tivesse sido introduzida gradualmente diversa maquinaria. No entanto, a mão do vidreiro esta sempre presente.
A partir de 1940, com o desenvolvimento na produção do vidro plano e posteriormente com a descoberta do sistema Float, deu-se uma alteração bastante profunda dentro da indústria vidreira.

Os anos 50 trouxeram um novo desenvolvimento, com o vidro de embalagem. A reviravolta final, deu-se nos anos 70, com a cristalaria automática.
Foram criados subsectores de actividade, onde a cristalaria manual perdeu influência, tendo começado a ser relegada para último plano.


O quadro que apresento, em seguida, mostra a evolução que a indústria vidreira teve em Portugal e em particular na Marinha Grande.

Região Demarcada do Vidro
da Marinha Grande
Sec, XXI
Vidro Plano
Vidro de Embalagem
Cristalaria Automática
Cristalaria Manual
Anos 70
Cristalaria Manual
Anos 50
Cristalaria
Anos 40
Indústria Vidreira
Até Séc. XX
Indústria Vidreira

Informação cedida pelo Senhor Director do Crisform, Dr Sousa Lopes


A esta evolução tecnológica juntou-se a tão falada globalização dos mercados mundiais.
O Sistema Capitalista, a livre concorrência, a procura de mais lucro, acaba por trazer encerramento de empresas e a procura de mercados, em países com mão-de-obra mais barata, e com trabalho infantil em larga escala.
Esta situação leva ao desemprego inúmeras famílias, os dramas sociais passaram a fazer parte do dia a dia de muitos daqueles que, durante dezenas de anos, trabalharam nesta profissão.
A tendência no sector manual do vidro (cristalaria) será para ficar uma ou outra empresa, com poucos operários, que se disponham a fazer pequenas séries de artigos, cuja produção não seja compensatória em sectores automatizados.
Pequenos estúdios, onde se possam executar peças manuais, poderá ser outra aposta no futuro.
A colaboração entre alguns jovens designers e alguns, poucos, vidreiros, que ainda acreditam ser possível continuar a trabalhar o vidro manualmente, poderá ser outra solução.
Os próximos tempos não serão de facilidades, mas ainda continuo optimista!...

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